quinta-feira, 14 de março de 2013

As estrelas também ardem

Depois de mil combates, 
depois de mil ferimentos, 
eu sou aquele que pode ainda lutar 
contra moinhos a vento, 
mas que fracassa,
a maior parte das vezes,
no combate contra si mesmo.
O vinho é tinto maduro;
Mesmo assim o Cristo não me ajuda.
Os erros foram muitos.
Mas,
cada um deles,
participou na construção
do que sou hoje.
Quando cai a noite,
quando as estrelas brilham,
só os sonhos impossíveis
permitem alguma esperança
e o teu sorriso, cigana
é mais forte que a minha cobardia.

Carlos Tronco
Atlântico norte
12/03/13



-Queres um colinho?



-Quero,

é como no escano, 

queimam-se os pés 
e gelam-se as nádegas...

-Não é bem assim.
-Esta bem então.

-Por onde te pego?
a tua cara que repousa no meu ombro,
os teus braços a volta do meu pescoço?
o teu peito contra o meu peito
e ao teu ouvido cantaria
provavelmente...
levava-te ao teu leito,
beijinho na testa,
apagava a luz,

e ia por ai fora por caminhos desconhecidos, 
até ao topo da serra
para poderes dormir feliz.

Talvez alguma onda me levasse...
-Não apanhes frio!

Nus, um contra o outro, 
o termo dinamismo funcionaria melhor
sentir a tua pele, o teu calor, as tuas reacções
fechava os olhos, para não te tornares tímida
para melhor te sentir
nunca te tive sentada 
no meu colo 
de olhos fechados,
para poder responder sem mentir
se abrisse os olhos tu ias rir muito, 
acharias que batotava
nunca jogaste à batota?

Como te sentes assim nua, 
sentada no meu colo?
As tuas delgadas pernas a volta da minha cintura?
Uma manta seria necessária?
Se no teu quarto se fosse autorizado a entrar?
Senão, no sofá.
Cuidado com a pele do teu pescoço, 
não me barbeei hoje
teria de tocar levezinho, só com a ponta dos lábios
tão leve, quão é pesada a distância
Os teus longos dedos, 
palmilhando as costas vergadas
pelo medo de não saber dizer
o teu calor invade
a minha alma.
Sabes o que é a esperança?
Sabes o sabor de um beijo sonhado?
Adormece se te sentes bem.
Acorda se assim o desejas
Ama-me se o teu ser o permite
Abraça-me
porque um abraço sincero nunca matou ninguém
gostas de estar assim abraçadinha a mim?
ter-me por companhia
junto com o frio
deste fim de inverno
desta fim de tarde
de um fim de vida
quem sabe...

não devia prometer se fosse bem comportado
não ousarias dar-me a mão 
quando me viesses buscar ao barco?

-As comadres podiam falar?

-Ai!
Uma bofetada só porque tentei pegar-te na mão?
Meio isolado
machista
a vida dos outros como ocupação
não deve ser fácil, ser mulher, responsável, chefe
não gostando de sobressair, nem ser alvo das atenções...
e solteira 
todos os dias
Sabes
um carinho é um carinho
e meu colinho de vez em quando 
não te fazia mal nenhum.

Carlos Tronco
São Jorge
09/03/13


sexta-feira, 1 de março de 2013


Fado de meias tábuas

Pinheiro, vou-te cortar
E levar-te junto ao mar
Pois tábuas quero fazer.
Construirei um caixão
Onde não quero, perdão
Morar, mesmo se morrer.

Se ele da para enterrar
Dará, para ir ao mar
As sereias conhecer.
Com um mastro e uma vela
Será a nau a mais bela
E assim te convencer.

Claro, não sei navegar
Para quem tem voz, cantar
É a única solução.
Se não for fado é lamento
Mesmo a lutar contra o vento
Será a nau da paixão.

Com três tábuas navegar
E o vento a colaborar
Se um dia avistar terra,
Digo, abraça-me cheguei
Vim sem coroa, não sou rei
Peito nu, não quero guerra.

Trago apenas o coração
E se tu me deres a mão
Daremos voltas ao mundo.
Daqui para a frente andar,
Primeiro há que serrar
O madeiro: o mar é fundo.

Um dia chegado à praia
Perguntar-te-ei catraia:
-Lembras-te do que prometi?
Os anos já foram muitos
Uns perdidos outros juntos
Mas sempre gostei de ti.

Carlos Tronco
Vendôme
01/03/13